quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Nova Lei do direito autoral

Direito autoral, cultura e educação. Arakin Monteiro


ARede nº61, agosto 2010 - Para além de sua função de resguardar os interesses morais e patrimoniais dos criadores de obras artísticas e intelectuais, os direitos autorais deveriam facilitar e promover o acesso aos bens culturais e educacionais por toda a sociedade, de maneira equilibrada. No entanto, a legislação brasileira de direitos autorais acabou por se tornar um entrave à livre difusão cultural, à educação, ao avanço científico-tecnológico e, consequentemente, ao desenvolvimento econômico.

Afirmar que a Lei de Direitos Autorais se tornou um obstáculo para o desenvolvimento não significa colocar-se contra os autores e seus direitos. Pelo contrário, trata-se de desconstruir a distorção ideológica orquestrada pela “indústria do copyright”, que se apropria da produção intelectual e artística para remunerar a si mesma.

Em virtude do peso absolutamente dominante dos intermediários no processo de produção e distribuição dos bens culturais, a sociedade é criminalizada, enquanto os elefantes brancos do direito autoral (que recebem polpudos subsídios públicos) fomentam a repressão contra professores, estudantes e trabalhadores, seja por meio de suas campanhas antipirataria ou pelo suporte e coerção que exercem por meio do Estado.

A indústria do copyright encontra-se em confronto direto não apenas com os anseios e necessidades sociais, mas com a própria história. A menos que aceitemos uma visão ludista – que deposite no próprio desenvolvimento científico-tecnológico a responsabilidade última por suas mazelas –, veremos o quão quixotesca tornou-se a empreitada dessa indústria na repressão e estigma (moral-ideológico) das práticas sociais. Essa situação torna-se ainda mais absurda ao observarmos como o Poder Judiciário tem servido de instrumento repressor, reconhecendo e defendendo a interpretação da lei realizada por este grupo de interesses, muitas vezes com desrespeito explícito aos direitos humanos. Em âmbito internacional, o tempo de proteção das obras tem crescido gradativamente em detrimento do bem público e a favor dos interesses da indústria (e somente dela).

Estes e outros conflitos são frutos do descompasso existente entre a legislação em vigor e o desenvolvimento tecnológico articulado às novas práticas sociais. No Brasil, temos em vigor uma das legislações mais restritivas e conservadoras do mundo. Embora a Convenção de Berna e o acordo TRIPS nos obriguem a proteger as obras por 50 anos após a morte do autor, o nosso prazo de proteção é de inexplicáveis 70 anos, reduzindo o espectro do domínio público em 20 anos. Ou seja, são 20 anos de produção cultural e científica que permanecem sob o monopólio abusivo de editoras e gravadoras, garantido pela subserviência voluntária do Estado brasileiro.

Após quatro anos de discussão e debates com diversos setores da sociedade civil, o Ministério da Cultura publicou a consulta pública sobre o projeto que reforma a Lei de Direito Autoral (disponível em: http://www.cultura.gov.br/consultadireitoautoral). A consulta pública foi prorrogada e ficará aberta até 31 de agosto. É uma excelente oportunidade para que estudantes, professores, pesquisadores, autores, artistas e sociedade defendam seus interesses e pressionem o legislativo para que o projeto seja levado a diante.



Arakin Monteiro
é sociologo,doutorando em Ciências Socials pela Unesp.É integrante da Rede de Estudos do Trabalho(RET) e do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à informação(GPOPA/USP)

Artigo retirado da revista- http://www.arede.inf.br/inclusao/edicoes-anteriores/166-arede-no-61-agosto2010/3322-opiniao

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